quarta-feira, 28 de agosto de 2013

A Condição de ter você.

Nem o trabalho de ficar em casa evitou o sufoco, nem os desvios de olhares evitou a dor que palpitou. Embora a boca seca sem saliva, ainda sentia uma palavra. A lágrima estava exposta no seu olhar embora não caía, havia algo que prendia aquela emoção. Ela não falava com a boca, mas me dizia tudo com aquele olhar. Doeu, eu senti! Doeu na solidão dela e perturbou a minha paz. É... Não sabia o que dizer embora ela soubesse o que poderia ser dito. Se antecipou e deu de ombros enquanto seu olhar de esgueira me atingia a alma.

Não me restava nada mais, nem a alma. Meus olhos doíam como um veneno que me prendia a garganta. Minha garganta era um cais em que cada gole seco vinha em forma de onda e ao respirar engolia cada palavra não dita, com um tom agudo que me doía o peito. Eu sabia que iria guardar aquele momento por um longo tempo. Ela me conhecia muito bem para ficar, sabia que mais cedo ou mais tarde algo iria acontecer. Eu gostaria de ter-lhe dito o que estava na ponta da língua. Havia ensaiado uns minutos atrás, mas não haveria sentido ter-lhes dito. Foi o que ela pensou e não me esperou. Não seria justo com nenhum de nós. Não poderíamos evitar toda aquela confusão. Não se pode levar a diante o que não se pode aguentar.

Ela havia deixado toda sua mobília em meu apartamento, e tudo aquilo representava cada ferida exposta. Eu a conhecia bem, ela não voltaria para vir busca-la. Pois ela sabia muito bem que voltar seria mais doloroso. Mandou outra pessoa em seu lugar para busca-la. Ajudei os rapazes da mudança a levar tudo para o caminhão de mudança, antes que minha carne virasse apenas pus. Meu apartamento estava do mesmo jeito em que eu me encontrava. Vazio. Não seria certo fazer do vazio minha casa. Então deixei espaço para que outras coisas pudessem a ocupar. Mas ao passar dos dias aquele lugar parecia-me maior do que eu.

Depois de muito tempo conheci várias pessoas, mulheres de todos os tipos e uma em especial em que eu havia me apaixonado. Nos encontrávamos em um bar todas às noites e compartilhávamos nossa solidão no meio de tanta gente. Eu sabia que havia chegado a hora de levar-lhe ao meu apartamento, mas não sabia como ela iria reagir. Lembrei-me que não tinha nada a perder, ela iria embora em poucos dias. Não havia contado-lhe o ocorrido, mas ela iria entender. Dei um gole forte de conhaque que me desceu ao coração e aqueceu o corpo ao ponto de dar-me coragem de leva-la até meu apartamento.

Ao entrar ela olhou todos os compartimentos e perguntou:
- Daniel, meu amor, a dona dessa sua solidão é a mesma em que lhe levou tudo? 
- Eu não tive tempo de comprar móveis novos! Não tenho nem como lhe oferecer algo para beber ou comer! - Disse cabisbaixo, sem jeito, desviando o meu olhar do ela. Pois me doeria a garganta novamente.
- Daniel, Você precisa ocupar todo esse espaço, porque do contrário não te restará nada. Não há nada mais doloroso do que viver no próprio vazio. Quero que lhe compre móveis novos. Não quero que as mulheres saim correndo antes de terem a chance de te conhecer. Você é um cara incrível, Daniel. Nem todas são loucas como eu, elas não o entenderiam.

Ela se aproximou e levantou os olhos e encontrou meus olhar, e ao olha-la sentia a mesma sensação que a Lívia havia me deixado à uns meses atrás. E aquelas palavras me entraram na pele, arderam como brasa. Ardia mais do que aquelas palavras como brasa em pele quente, ela olhando pra mim. E em um dejavú ela deu de ombros enquanto seu olhar de esgueira me atingia não a alma, pois já não a tinha mais, mas todo aquele espaço que habitava meu peito. Lívia era minha condição a prisão perpétua. Embora aquelas palavras de Júlia haviam me dado um pouco de esperança.


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